13.12.06
Problema do tamanho da cabeça
Escrevi aqui na semana passada sobre Barry Bonds. Deixei bem claro que eu tinha certeza de que ele jogaria em 2007 ainda nos Giants. Não deu outra. Eu só errei quando disse que seu salário sofreria um belo corte. Bem, US$ 2 milhões são um belo corte, mas nem tanto se comparados ao salário que ele recebia no ano passado: foi um corte de 11%.

Pode até ser que haja outros assuntos mais interessantes para se falar nessas férias do beisebol. Mas a Questão Bonds é um assunto intrigante, que sempre representa boa lenha para se jogar na fogueira. Parte da torcida dos Giants e uns poucos torcedores de outros times idolatram o cabeçudo. Querem a qualquer custo que ele bata o recorde de home runs de Hank Aaron, e dane-se a montanha de acusações de doping.

A esmagadora maioria dos torcedores de outros times acha que o simples fato de ter passado Babe Ruth, assumindo a vice-liderança da lista, já foi uma mancha suficiente e torce para que Bonds não consiga os 21 home runs que faltam para o recorde. São essas mesmas pessoas que fazem com que os Giants soem defensivos até demais por uma renovação de contrato que, para qualquer outro jogador, teria tido pouca repercussão além dos valores.

"Eu não vou me desculpar por Barry ser o nosso quato rebatedor", disse o gerente geral do time, Brian Sabean, de forma algo impaciente, na segunda-feira. Não só não vai se desculpar, como vai tentar fazer do anúncio oficial, ainda nesta semana, um pronunciamento grandioso. Algo como algum presidente brasileiro dando grandes notícias em véspera de eleições.

Essa renovação é uma renovação sem ética, em que os Giants venderam o que restava de sua integridade em troca de alguns ingressos vendidos. Como eu disse lá em cima, há pessoas que vão aplaudi-la — e, se alguma delas ler estas linhas, vão aproveitar para me criticar. Mas, pelo que leio por aí, mesmo entre torcedores dos Giants, há desapontamento e raiva.

Não por causa de Bonds em si ou mesmo do que ele significa. Mas porque a torcida de São Francisco, como qualquer outra, quer, acima de tudo, ganhar. E esse pessoal não acredita que os Giants vão ganhar com Bonds, em decadência clara. Pior: eles não acreditam que a diretoria do time se importe em ganhar. O mercado de agentes livres é obsceno, e não me refiro só a este ano. A torcida sabe que os Giants não tinham muitas opções. O que eles não entendem é como os Giants não puderam prever essa situação e planejar melhor o que fazer ao longo dos dois últimos anos de derrotas.

Ao final da temporada passada, Sabean disse que os Giants iriam tentar uma nova tática, porque "mais velhos e mais experientes não funcionou". E a torcida agora acha que era só jogo de cena, um claro eufemismo para "mentira". Quem acreditou no dono do time, Peter Magowan, quando este disse que Bonds não seria o núcleo do time deve estar usando um nariz de palhaço agora.

A jornalista Ann Killion, do jornal San Jose Mercury News, falou com membros importantes da diretoria dos Giants, e vários deles acham difícil de acreditar que o time tenha deixado Bonds de novo dar as cartas. Eles se perguntam se quem tomou a decisão não percebeu todos aqueles assentos vazios em 2006.

A renovação de contrato torna os Giants participantes ativos e por completo no legado manchado de Bonds. Até agora, dava para dizer que o time era um mero cúmplice. O último contrato que eles deram a Bonds foi em 2002, quando ele ainda estava produzindo números históricos e bem antes das detalhadas acusações de uso de esteróides começarem a aparecer.

Sim, eles acataram a opção que tinham naquele contrato — uma decisão que imediatamente voltou-se contra os Giants, já que ele ficou contundido durante a maior parte da temporada de 2005. Mas acatar uma opção é uma decisão muito mais passiva do que dar a Bonds, que vai fazer 43 anos em julho, um contrato de um ano a US$ 16 milhões.

Ao contrário do que possa parecer, estas divagações não têm tanto a ver com os esteróides. Se Bonds não estivesse prestes a quebrar o sagrado recorde de home runs de Hank Aaron, os Giants nem pensariam em trazê-lo de volta. Eles não se sentem intimidados pelo recorde prestes a ser manchado, pelo caminhão de evidências contra Bonds maior que a cabeça dele, pelo que os livros de história do esporte vão falar do jogador e do time que o abrigou. Os Giants tiveram a chance de se livrar dessa pecha, de deixar que isso fosse problema de outrém. Ao invés disso, eles optaram por se envolver até o pescoço.

Mas não é só isso. É também uma decisão esportiva questionável moralmente.

Os Giants estão recompensando um jogador que se recusou a rebater como reserva em jogos cruciais da temporada passada. Que determinou quando e onde ele jogaria. Que fez o técnico parecer um idiota. Que nunca deu a mínima para ninguém no time.

Os Giants precisavam tomar outro rumo. E não o fizeram. Os Giants ficaram de fora dos playoffs nos últimos três anos. Renovar com Bonds não fez aumentar suas chances para 2007.

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Escrito por Alexandre Giesbrecht | 0 comentários
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